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  • 1 Faculdade Dom Pedro II - São Carlos-SP (1928-2009)
    Acervo Valentim Gueller Neto
  • 2 Bonde da Carne São Carlos–SP (1912-1962)
    Acervo Raymond DeGroot
  • 3 Estação Ferroviária de São Carlos-SP (1925)
    Acervo Valentim Gueller Neto

Estação 18 - A Estação Ferroviária de São Carlos

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Quando Antônio Carlos de Arruda Botelho, o Conde do Pinhal, com os fazendeiros aliados do café construíram e inauguraram, em 1884, a Estação Ferroviária de São Carlos, a fizeram externamente em tijolo aparente. Esta foto é a única de que se tem notícia que mostra aquele detalhe. Fotos 01 e 02





Sob o vértice do vão central havia uma gravura com a forma de elipse, talvez uma foto. Hoje, em seu lugar, está o relógio. Foto 03





Nos arquivos da Fundação Pró-Memória de São Carlos, a foto acima está datada de 1908, mas pode até ser que anteceda, pois a ferrovia chegou no município em 1884, pela Companhia Rio Clarense que a operou até 1888, ano em que transferiu os direitos para a Rio Claro Railway e esta, a vendeu para a Companhia Paulista de Estradas de Ferro, em 1892.

As oficinas e armazéns também tinham as mesmas características. Fotos 04 e 05











Nos arredores da Estação, algumas edificações
acompanharam o seu estilo como foi o caso da Serraria Giongo, fundada em 1897 e que tinha um 
ramal ferroviário para o transporte de madeiras. Foi desativada em 1991 e hoje apenas parte dela apresenta ainda as características originais da construção. Foto 06


Hoje, naqueles barracões, estão instalados uma agência dos Correios e uma Pizzaria.


Fotos 07 e 08








A Companhia Paulista promeu uma
grande reforma no prédio e a Estação ganhou novas dependências, novas
janelas e o relógio com o "cupim" sobre ele,

mas os tijolos à vista foram revestidos com argamassa. Fotos 09 e 10


Na plataforma, havia praticamente três ferrovias, a linha tronco em bitola larga que ligava São Paulo à Colômbia , trem de aço-carbono à esquerda, o ramal para Ribeirão Bonito em bitola métrica, trem de madeira à direita, que partia da Estação no sentido Araraquara. Foto 11

E o ramal para Santa Eudóxia, trem de madeira em bitola métrica, que partia da Estação no sentido Itirapina




fotos 12 e 13







Em 27 de dezembro de 1914, deu-se a inauguração da quarta ferrovia; as linhas de bondes da Companhia Paulista de Eletricidade, integrando-se na Estação a "nova" ferrovia urbana às ferrovias inter-municipais. Foto 14






Em 1920, o movimento da Estação já era significativo, os bondes atendiam os horários dos trens para embarque e desembarque. Ao fundo, após o prédio da Estação, o barracão da Forjaria CIAR da família Ciarrochi. Forjavam ferramentas manuais; machados, marretas, enxadas, foices, enxadões...A CIAR teve seu espaço desapropriado em 1966, para a construção do Viaduto 4 de Novembro. Foto 15








1925, não eram mais somente os bondes e as carroças, os automóveis começaram a marcar presença no largo da Estação. Foto 16








Anos 30, os carros de aluguel, táxis, chegaram nessa década, era sinal de status chegar ou sair da Estação num carro alugado. Surgiu a necessidade de sombras e os engradados com mudas de árvores também se integraram ao local. Foto 17






Anos 40, os trilhos dos bondes e a rede de fios trolley se multiplicaram. O ponto ganhou um abrigo para as pessoas que esperavam o bonde se protegerem do sol e da chuva. As figueiras cresceram e já serviam para fazer sombras para os carros de aluguel. Foto 18







Anos 50, em 1957 , as figueiras já estavam copadas, as ruas calçadas com paralelepipedos e para comemorar o centenário de São Carlos, a Companhia Paulista pintou a Estação, deixando ela ainda mais linda e majestosa. Foto 19






Anos 60, em 15 de junho de 1962, a Companhia Paulista de Eletricidade encerrou a operação dos bondes após cinquenta anos de contrato; a ferrovia urbana deixou de existir, ficando um vazio muito grande para todos os são-carlenses que viram a cidade crescer nas margens daqueles trilhos. Foto 20


Mas, antes disso, em 12 de fevereiro do mesmo ano, a Companhia Paulista de Estradas de Ferro extinguiu o ramal para Água Vermelha e Santa Eudóxia
. E, em 03 de janeiro de 1969, foi encerrado o ramal para Ribeirão Bonito .
Numa só década, se foram as três ferrovias e a Estação começou a ficar sem passageiros.


Anos 70, as figueiras que levaram trinta anos para formarem suas copas, não estão mais lá.
Para abrigar os carros de aluguel, foi construído uma cobertura metálica. Os trilhos dos bondes já haviam sido retirados, e o calçamento de paralelepipedos foi substituído pelo asfalto.


Também nos anos 70, no pátio ferroviário, haviam os depósitos de locomotivas da CP. Na  foto, já abrigavam as locomotivas da FEPASA. Foto muito rara, talvez única, que me foi enviada em 12 de novembro de 2013, pelo amigo de São Paulo, José Luis Braz. .Foto 21 -1
                 


Anos 80, com a extinção dos ramais ferroviários
e com o surgimento das rodovias muitas delas nos leitos dos antigos ramais, a indústria automotiva cresceu e os veículos passaram a fazer as vezes dos trens de passageiros e eles foram desaparecendo das estações. Na Estação de São Carlos já predominavam as composições de carga. Foto 22





Em janeiro de 1989, meu filho Daniel tinha quase sete anos, minha esposa e eu o levamos para passear de trem, Hoje, ele é um dos poucos jovens que andou de trem na infância. Foto 23






Anos 90, felizmente a Prefeitura Municipal de São Carlos foi negociando com as ferrovias e com os órgãos federais e foi assumindo o prédio da Estação; e em 1998, a Fundação Pró-Memória passou a ocupar parte do espaço administrativo daquelas instalações e através dos anos foi ocupando todas as dependências e se tornando responsável pelo prédio. De local de embarques, desembarques e baldeações de passageiros, começou a ser um centro cultural.

Anos 2000, Em 15 de março de 2001, a Estação deixou de ser de passageiros, dela partiu o último trem de passageiros com destino à Araraquara e acabou a última ferrovia de passageiros da Estação de São Carlos. No mesmo ano nasce a sucessora a

Detalhe: A Estação de São Carlos não chegou a ser invadida e depredada como tantas outras que foram abandonadas e estão até hoje pedindo por socorro.
Em 2008, para comemorar os cem anos da reforma da Estação pela Companhia Paulista, a Fundação Pró Memória encomendou ao maquetista ferroviário, Sergio Paulo Doricci , uma maquete com os detalhes daquele prédio em 1908, ainda quando tinha as paredes externas em tijolos aparentes. O resultado é esse aí abaixo, uma réplica perfeita em escala 1:87 riquíssima em detalhes! A maquete está exposta no Museu Histórico e Pedagógico Cerqueira César, junto à plataforma da Estação Cultura. Foto 24

2010, O prédio se consolidou como Centro Cultural abrigando arquivo histórico, museu, auditório, sala de reuniões e a plataforma, palco de eventos semanais. Tudo bem que não tem mais passageiros, mas poderá passar a tê-los novamente com a volta de um trem turístio, a vapor, nos trilhos, que está por vir. Entre tantas perdas, até do "cupim" sobre o relógio,
Foto25
salvou-se o prédio da Estação! Se um dia os trens de passageiros voltarem, ela é uma das poucas estações que está em condições de ser novamente estação de passageiros. Hoje, a Estação Cultura - antiga Estação Ferroviária de São Carlos é símbolo de respeito ao Patrimônio Público, serve de exemplo e só dá orgulho! Foto 26



E hoje, 19 de setembro de 2010, eu tive uma grata surpresa ao passar pela manhã na Estação, o "cupim" está de volta, novinho, novinho!
Tendo oportunidade, passem por lá para conferir, ficou lindo e só da orgulho! Foto 27








Aproveite também para conferir os detalhes que são mostrados nesta vista lateral. Foto 28











Depois, observe as linhas frontais, posteriores e as divisões do prédio. Foto29










Finalmente, contemple a plataforma, o pátio ferroviário e os arredores da Estação. Foto 30




Créditos:
Fotos:
01, 02 e 03- Pró-Memória São Carlos - Foto Perez
04, 05, 09, 10, 12, 15,16,17, 18, 19, 21 e 22 -
Acervo Valentim Gueller Neto
06 e 20 -
Acervo José Alfeo Röhm - William Janssem
07, 23, 24 e 27 - José Alfeo Röhm
08 - Pró-Memória São Carlos - Mariana Lucchino
11 e 13 - -Foto Arte - José "Alemão" João
14 -
Acervo José Alfeo Röhm - Col. Allen Morrison
21-1 - Acerco José Luis Braz Leme
25 - Flickr - Rubens Chiri
26 - Pró-Memória São Carlos - Marcello Lima
28, 29 e 30 - Carlos Romais

Logos:
Pró-Memória e Estão Cultura - Site Pró-Memória São Carlos
Referência bibliográfica:
Estações Ferroviárias do Brasil - Ralph Mennucci Giesbrecht
Fundação Pró-Memoria de São Carlos - SP

Novo Milênio - Bondes do Brasil
Colaboraram:
Daniel e Maria Nazareth Gobato Röhm
Valentim Gueller Neto


Obrigado pela sua agradável companhia e até a Estação 18. Abraços, Alfeo.

Estação 17 - "A Médica do Trem"

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Recebi o artigo abaixo do Férreo Amigo Wanderley Duck, destacando o trabalho médico da Doutora Lilia Mesquita nos áureos tempos da ferrovia de passageiros no Brasil. Época em que quase nem se falava em rodovias e que as soluções de transporte dependiam quase que exclusivamente do trem. Agora, você é meu convidado, confira o trabalho dela logo abaixo:








"A médica do trem.

Wanderley Duck (*)

A vida me deu o privilégio de conhecer pessoas muito especiais, criaturas que certamente foram colocadas neste planeta para fazer dele um lugar melhor, e a Doutora Lilia Mesquita foi uma dessas pessoas.

A minha mulher e eu tivemos a honra de tê-la como madrinha do nosso casamento, em uma cerimônia civil muito simples, tão simples como era aquela mulher.







(JUNHO DE 1988) A DOUTORA LILIA, A MINHA MULHER E EU, EM FRENTE AO JUIZ DE PAZ.










É claro que ela não ficou famosa, que não teve o seu trabalho divulgado pela tal da mídia que tanto fala de jogadores de futebol, de políticos, de homens e mulheres vulgares e de um monte de nulidades.

Ela faleceu no começo desta semana, com 92 anos de idade, mas plenamente lúcida e independente.

O povo, os políticos e os repórteres não acorreram ao seu velório, como sempre acontece quando morre alguma celebridade, e tampouco o trânsito da cidade ficou mais tumultuado por causa do seu cortejo fúnebre, avenidas não foram interditadas para ela.

Também nenhum daqueles padres populares, aqueles que gostam de posar ao lado dos artistas quando esses enfrentam algum momento difícil, deu as caras por lá.

Não que eu esperasse algo diferente, afinal se quando faleceu o Doutor Zerbini, que até que era conhecido da população, o que houve foi quase que apenas uma notinha de nada nos jornais, em contraste a praticamente dias e dias só noticiando a morte de um esportista famoso que morreu na mesma época, imagine no caso da Doutora Lilia.

Um mestre escola boliviano, um sujeito muito simples, comentou comigo recentemente que o brasileiro parece só se orgulhar dos seus jogadores de futebol e das tais "mulheres melancia", que não dá a menor importância aos seus médicos, aos seus engenheiros, seus cientistas, professores e às suas outras pessoas boas e produtivas. Concordo plenamente com ele, mas acredito que isso não é um privilégio só do Brasil não, muitos outros povos também se comportam assim.

Feito este meu desabafo, vamos voltar no tempo e imaginar um Rio Grande do Sul de muito antigamente, aonde o que as famílias esperavam das meninas é que elas se casassem e virassem mães e donas de casa, se quisesse trabalhar enquanto esperava para casar, podia ser professora e era só isso.

Mas a Doutora Lilia queria ser médica e aí a coisa complicou.

Gaúcha de faca na bota, gaudéria no pleno sentido da palavra, não iria desistir do seu sonho só por causa de uma imposição familiar e então resolveu a questão de maneira simples, mudou-se para a casa de uns parentes em Curitiba, que se propuseram a ajudar, e com a desculpa de que iria cursar o normal, o curso que formava professoras primárias naquele tempo, foi é fazer medicina.

Ela era a única mulher da turma e na sua formatura a surpresa da família foi grande, pois só naquele dia é que descobriram que a filha tinha se transformado em uma médica. Pelo que a Doutora contava, só na hora do Juramento de Hipócrates é que eles perceberam que aquilo era uma formatura de médicos e não de normalistas.

Mas já estava feito mesmo e então, depois da esperada bronca, a vida continuou.

Anos depois, já trabalhando em São Paulo como ginecologista especializada em colposcopia, em uma fundação do Estado voltada à prevenção e ao tratamento do câncer, ela teve a idéia de expandir o seu trabalho preventivo às mulheres do interior paulista.

Era um tempo em que o rodoviarismo ainda não havia tomado conta do Brasil e as ferrovias ainda eram o grande meio de transporte, na verdade praticamente o único meio de transporte naquela época de estradas precárias e automóveis rústicos, e a solução que ela encontrou foi a que lhe pareceu óbvia, um trem.

Tanto fez que conseguiu do Governo do Estado um trem inteirinho, com vagão consultório, vagão laboratório, vagão alojamento e, de quebra, com todo o equipamento que fosse necessário.

Dá para imaginar a luta e as peripécias que ela teve que fazer para ganhar esse trem, aliás, pensando bem, nem dá para imaginar, só sei que ela brigou e conseguiu.

Antigamente as ferrovias tinham algumas composições que davam apoio médico aos seus funcionários, faziam exames médicos periódicos, rastreamento de casos de tuberculose, prevenção contra a malária e coisas assim, e foi um desses antigos trens do chamado "serviço sanitário", que naquela época já não existia mais, que deram para ela.






O VAGÃO CONSULTÓRIO DO "TREM DA DOUTORA" NA ESTRADA DE FERRO SOROCABANA.




Ia alguém na frente, para pedir à emissora de rádio da próxima cidade que avisasse ao povo sobre o dia em que o trem estaria lá e, quando ele chegava na estação, já tinha uma imensa fila de gente esperando.
Não eram apenas as mulheres da cidade que vinham, também aparecia muita gente da zona rural, que chegavam em carroças e até a cavalo. Infelizmente não consegui a tempo uma foto que deve ter ficado na casa da Doutora Lilia, uma mulher grávida chegando a cavalo para fazer os seus exames.
Contava a enfermeira Cecina, que fazia parte da equipe, que se, além da rádio, eles conseguissem que o padre também avisasse na missa do domingo, o sucesso era garantido.
Eles ficavam uns dois ou três dias em cada cidade, alojados no próprio trem, e com isso eram feitos todos os exames de prevenção de câncer ginecológico naquelas mulheres, que de outra maneira dificilmente teriam acesso a eles, com direito inclusive a um citologista que ia junto e que tinha a bordo um bom microscópio, para ler as lâminas dos testes de Papanicolau que fossem consideradas suspeitas.




DOUTOR GEÓRGIOS PAPANICOLAU (1883-1962) O MÉDICO GREGO QUE DESENVOLVEU OMÉTODO DE DETECÇÃO PRECOCE DO CÂNCER GINECOLÓGICO, O TESTE DE PAPANICOLAU.







O trabalho dela começou na linha da Estrada de Ferro Sorocabana e deu tão certo que, no final, ela também acabou ganhando um trem na Companhia Paulista de Estradas de Ferro, cuja linha era de bitola larga e não poderia ser percorrida pelo trem da Sorocabana, que era de bitola estreita.
Como ela e a equipe não viajavam o ano inteiro, boa parte do ano ficavam realizando as suas atividades de rotina na fundação em que trabalhavam, nos períodos de ociosidade esses trens passaram a ser usados também como postos volantes de puericultura por um outro grupo de profissionais e também apresentaram um ótimo resultado.

Depois veio o progresso, as cidades do interior ganharam uma melhor estrutura médico-sanitária e esses trens se tornaram desnecessários e foram encostados.
A última notícia que tive daquele da Sorocabana foi que ele estava se acabando ao relento em Santos e que do trem da Paulista só sobrou um vagão, que estava abandonado em uma estação desativada perto de Campinas, é só o que eu sei deles.





O ÚNICO VAGÃO QUE RESTOU DO TREM QUE PERCORRIA A LINHA DE BITOLA LARGA.






O velório e a cerimônia de cremação do corpo da Doutora Lilia Mesquita foram discretos e modestos, não teve notícia no jornal e certamente o seu nome não irá batizar nenhuma rodovia ou avenida, acredito que nem mesmo alguma acanhada rua do Bairro da Aclimação, aonde ela sempre morou desde que se mudou de mala e cuia de chimarrão para São Paulo, terá o seu nome.
Ao contrário das nulidades famosas, entretanto, ela vai continuar viva para sempre, através dos filhos, dos netos e dos bisnetos das incontáveis mulheres cuja vida o trenzinho dela salvou."


Nota: O Wanderley me contou que a Dra. Lilia Mesquita nasceu em 1918 e faleceu em São Paulo no Bairro da Aclimação, em maio de 2010 aos 92 anos. Me contou também que a ABPF de Campinas resgatou um dos carros do "trem da Doutora Lilia", justamente o da última foto que ilustra o artigo acima, mas Infelizmente o tempo de abandono daquele carro lá em Vinhedo e mais algumas outras dificuldades, impedem o seu restauro no original, então ele vai ser rebitolado e remodelado como um primeira classe, mas tudo bem, ao menos está salvo...

Créditos:
Artigo e fotos: Wanderley Duch

Colaboraram: Daniel e Maria Nazareth Gobato Röhm

Obrigado por sua agradável companhia, nos encontraremos certamente na Estação 18.
Abraços, Alfeo